segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Cemitérios de Londres




                Morte alcançou o topo da colina e vislumbrou a cidade se descortinando aos seus pés no exato momento em que o sol se escondia no mar, do lado oposto. Os lampiões de Londres brilhavam pouco, como se a cidade se preparasse para sua visita mensal. Desceu a estrada e entrou pela cidade murada, silencioso como a fumaça. Naturalmente, nenhum dos mortais que ainda restavam nas ruas podiam lhe ver, para a sorte deles, pois a visão de um homem alto, de capa, capuz e luvas negros, com uma máscara de ferro e uma foice de folha larga numa mão não seria a mais apreciada pelos bêbados renitentes. Porém alguns anjos que, em pé nos telhados, vigiavam os arredores das casas de seus protegidos, faziam cara de desprezo ao avistá-lo. Morte simplesmente virava a cara. Algumas vezes um humano acabava por lhe atravessar. Morte não sentia nada, mas o humano em questão era automaticamente acometido de uma vontade irresistível de voltar para casa. Virou uma esquina e entrou por uma rua larga, no fim da qual um cemitério esperava. Parou a frente do campo santo e bateu com a ponta do cabo da foice no chão uma vez. Em instantes alguns vultos esbranquiçados haviam atravessado as paredes brancas e o portão de ferro e se reunido ao redor dele. Morte não via nada se os olhasse de frente, porém, com os cantos dos olhos, se distinguiam suas formas e feições. A maioria trazia o olhar confuso dos novos mortos, porém alguns poucos miravam seu novo mestre com resignação. Se Morte os via ou não, não tinha importância. Sabia muito bem que os fantasmas estavam presos ás runas mais velhas que o tempo gravadas no cabo e na lâmina de sua foice, e que agora lhes pertenciam, quer quisessem, quer não, até o momento que os entregasse ás autoridades competentes. Alguns espíritos falavam sem se entender, e suas vozes soavam como neve caindo. Morte não se importou em prestar atenção.